FMI corta previsão de crescimento do Brasil para 5,2% neste ano

A alta dos preços das commodities melhorou a perspectiva de crescimento para o grupo de países emergentes e em desenvolvimento exportadores de matérias primas, segundo o mais recente “Panorama Econômico Mundial” (WEO), do Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas na contramão de outros pares, as previsões para o Brasil foram rebaixadas para um crescimento de 5,2% neste ano e de 1,5% e 2022, uma queda de 0,1 e 0,4 ponto percentual, respectivamente.
As novas projeções do FMI para o crescimento do Brasil neste ano e no ano que vem estão agora próximas às do consenso do mercado. Segundo o Boletim Focus do Banco Central (BC), a mediana das estimativas dos analistas aponta para uma expansão de 5,04% em 2021 e de 1,54% em 2022.
Os economistas do FMI também veem uma significativa alta da inflação ao consumidor no Brasil neste ano, para 7,5%, de uma taxa de 3,2% em 2020. Para o próximo ano, o Fundo vê uma moderação da taxa de inflação para 5,3%.
O Fundo também estima que a taxa de desemprego brasileira permanecerá acima de 13% neste ano e no próximo, em linha com a lenta recuperação do mercado de trabalho observada não só nos emergentes como também nas economias avançadas em virtude de mudanças estruturais relacionadas à pandemia de covid-19.
Corte modesto
O ajuste baixista nas projeções de crescimento para o Brasil reflete o efeito esperado da alta na taxa básica de juros, dada a inflação elevada no país, afirmou Gita Gopinath, economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), durante entrevista coletiva de imprensa hoje para comentar o último relatório “Panorama Econômico Mundial” (WEO, na sigla em inglês).
Além da política monetária, Gita citou também a revisão para baixo no crescimento esperado para os Estados Unidos, que é um dos principais parceiros comerciais do Brasil, observou. “Essa combinação nos levou ao corte”, disse.
Petya Koeva Brooks, que coordenou o relatório, ponderou que, em julho, o FMI havia elevado as projeções para o Brasil. “É importante ter isso em mente quando olhamos para os números gerais. No fim, é um rebaixamento bem modesto. Mas, se você olhar por um ponto de vista mais amplo, os preços de commodities mais altos e o retorno de manufaturas e atividades de serviços foram importantes para a recuperação”, afirmou.
Variante delta
A recuperação econômica global continua, mas o impulso da retomada perdeu um pouco de força com o ressurgimento da pandemia de covid-19 provocando rupturas nas cadeias de fornecimento globais, alerta o Fundo Monetário Internacional (FMI) em seu mais recente relatório “Panorama Econômico Mundial” (WEO, na sigla em inglês). Diferenças no acesso à vacinas contra a covid-19 e de espaço fiscal para proporcionar políticas de suporte econômico continuam a ampliar o fosso no ritmo da recuperação entre países avançados e emergentes e em desenvolvimento.
A rápida disseminação da variante delta, muito mais transmissível, e o risco de surgimento de novas variantes aumentaram a incerteza em relação a quanto tempo o mundo levará para superar a pandemia. As escolhas políticas ficaram mais difíceis e as autoridades hoje contam com menor espaço de manobra diante de vários desafios: fraco crescimento do emprego, aumento da inflação, insegurança alimentar, erosão da renda e impacto das mudanças climáticas.
“No geral, os riscos à perspectiva econômica aumentaram e as decisões políticas se tornaram mais complexas”, observou a economista-chefe do FMI, Gita Gopinath, em comentário que acompanha o relatório.
Diante do cenário mais desafiador, os economistas do FMI reduziram sua previsão de crescimento da economia global para 5,9%, de uma expansão de 6% estimada em julho. Para 2022, a expectativa de crescimento se manteve estável em 4,9%. Essa revisão reflete a estimativa de desaceleração do crescimento das economias avançadas para 5,2% — queda de 0,4 ponto percentual — em parte devido as rupturas nas cadeias de suprimentos globais, e piora na perspectiva para as economias em desenvolvimento em virtude do cenário ainda crítico da pandemia — especialmente na Ásia.
Entre as principais economias, destaque para a revisão em baixa na expectativa de crescimento da economia dos EUA, de 7% para 6% neste ano, e da Alemanha, de 3,6% para 3,1%.
Em relação a China, os economistas do FMI reduziram sua estimativa de crescimento para a segunda maior economia do mundo em apenas 0,1 p.p. para 8,0%. Entre os riscos citados à sua perspectiva, o FMI cita a reestruturação desordenada do setor imobiliário da China e escalada nos conflitos comerciais e tecnológicos. A recente crise energética na China possivelmente não está contemplada no cenário do WEO.
Em discurso preparado para a apresentação do documento nesta terça-feira, Gopinath destacou que os recentes desenvolvimentos deixaram claro que não é possível acabar com a pandemia em um país ou região enquanto ela não tiver acabado no mundo todo.
“Se a covid-19 tiver um impacto mais prolongado — caminhando para o médio prazo — poderá reduzir o PIB global em US$ 5,3 trilhões no acumulado em cinco anos em relação a nossa atual projeção”, alerta. Ela acrescenta que tal cenário pode ser evitado se a comunidade internacional intensificar seus esforços para assegurar acesso equitativo às vacinas para todos os países, superar a relutância às vacinas nos países onde há uma oferta adequada e assegurar melhores perspectivas econômicas para todos.
“O principal fator comum por trás desses complexos desafios é o contínuo impacto da pandemia sobre a sociedade global”, observa Gopinath. “Portanto, a principal prioridade política é vacinar pelo menos 40% da população mundial até o fim do ano e de 70% até metade de 2022.”
Outra prioridade urgente detacada pelo FMI é a necessidade de desacelerar a alta das temperaturas globais e conter os crescentes efeitos adversos das mudanças climáticas. “Isso exigirá compromissos mais ambiciosos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa na Conferência Climática das Nações Unidas [CoP 26]”, destacou a economista-chefe do FMI.
A rápida aceleração das taxas de inflação no mundo, em especial nos EUA e em alguns países emergentes e em desenvolvimento, também é destacada no relatório. Os economistas do Fundo atribuem a pressão de preços as rupturas nas cadeias de suprimentos provocadas pela pandemia e alta das commodities em relação à baixa base de comparação anual.
O FMI mantém a expectativa de desaceleração da inflação em 2022, mas observa que em alguns países emergentes e em desnvolvimento a pressão de preços poderá persistir por causa dos preços maiores de alimentos, impacto do aumento nos custos dos combustíveis e efeito da desvalorização cambial sobre os preços de bens importados.
Gopinath recomenda que os países ajustem suas políticas com base nas condições econômicas e pandêmicas locais, visando fomentar ao máximo o emprego e ao mesmo tempo proteger sua credibilidade. “Com o espaço fiscal ficando mais limitado em muitas economias, os gastos com saúde devem continuar senso priorizadas, enquanto políticas de ajuda e transferência [de renda] terão de ser cada vez mais direcionadas”, afirmou.
Mas, ela alertou que “quando a situação da saúde melhorar, a ênfase política deve ser aumentar o foco nas metas estruturais de longo prazo”.
Recuperação global
A recuperação global continua, mas perdeu ímpeto prejudicada ainda pela pandemia, o que vai exigir um engajamento maior de países de alta renda para fazer vacinas chegarem a regiões mais vulneráveis, avaliou Gita Gopinath, economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), durante entrevista coletiva de imprensa para comentar o último relatório “Panorama Econômico Mundial” (WEO, na sigla em inglês).
“Surtos de pandemia em elos críticos das cadeias de abastecimento globais resultaram em interrupções de abastecimento mais longas do que o esperado, alimentando a inflação em muitos países”, disse ela. De modo geral, observou, os riscos para as perspectivas econômicas aumentaram e as escolhas de políticas tornaram-se mais complexas.
Em comparação com a previsão do FMI de julho, o crescimento global para 2021 foi revisado 0,1 ponto percentual (p.p.) para baixo, para 5,9%, permanecendo inalterado para 2022 em 4,9%. Essa projeção agregada, no entanto, esconde revisões importantes para alguns países, destacou Gita.
“A perspectiva para o grupo de países em desenvolvimento de baixa renda piorou consideravelmente devido ao agravamento da dinâmica da pandemia. O rebaixamento também reflete as perspectivas de curto prazo mais difíceis para o grupo de economias avançadas, em parte devido a interrupções na cadeia”, disse. “As interrupções relacionadas à pandemia em setores intensivos em contato fizeram com que a recuperação do mercado de trabalho fosse significativamente menor que a recuperação da produção na maioria dos países.”
Compensando parcialmente essas mudanças, ponderou, as projeções para alguns exportadores de commodities foram atualizadas devido ao aumento dos preços desses itens.
A produção agregada para o grupo de economias avançadas deve recuperar sua trajetória pré-pandêmica em 2022 e excedê-la em 0,9% em 2024, segundo Gita. Em contraste, o mercado emergente e grupo de economias em desenvolvimento (excluindo a China) deve permanecer 5,5% abaixo do patamar pré-covid em 2024, “resultando em um retrocesso maior para melhorias em seus padrões de vida”, disse.
Essas diferenças são, segundo Gita, consequência de uma “grande divisão vacinal” e de grandes disparidades nas políticas. “Enquanto mais de 60% da população nas economias avançadas está totalmente vacinada e alguns agora estão recebendo vacinas de reforço, cerca de 96% da população em países de baixa renda permanece não vacinada. Além disso, muitos mercados emergentes e economias em desenvolvimento, que enfrentam condições de financiamento mais restritivas e um maior risco de desancoragem das expectativas de inflação, estão retirando o apoio de políticas mais rapidamente”, disse.
Por isso, afirmou Gita, a prioridade política é vacinar pelo menos 40% da população de todos os países até o fim de 2021 e 70% até meados de 2022. “Isso exigirá que os países de alta renda cumpram os compromissos existentes de doação de doses de vacina, coordenem com os fabricantes para priorizar as entregas para a Covax [Facility] no curto prazo e removam as restrições comerciais ao fluxo de vacinas e seus insumos”, disse a economista. “Ao mesmo tempo, fechar a lacuna de financiamento residual de US$ 20 bilhões para testes, terapêutica e vigilância genômica salvará vidas agora e manterá as vacinas adequadas para o seu propósito”, acrescentou.
Questionada sobre a situação da África, Gita comentou que, infelizmente, o caso é particular em termos do baixo nível de vacinação. “Eu acho que a região onde há o acesso mais limitado a vacinas é no continente africano. Essa é uma das grandes preocupações que nós temos, porque sabemos que a pandemia não acabou e é por isso que estamos pressionando forte para chegar à meta de 40% para todos os países ao fim deste ano”, afirmou.
Olhando à frente, Gita disse que os fabricantes de vacinas e os países de alta renda devem apoiar a expansão da produção regional de vacinas contra a covid-19 nos países em desenvolvimento por meio de financiamento e transferência de tecnologia.
“Se a covid-19 tivesse um impacto prolongado – no médio prazo – poderia reduzir o PIB global em US$ 5,3 trilhões cumulativos nos próximos cinco anos em relação à nossa projeção atual. Não tem que ser assim. A comunidade global deve intensificar os esforços para garantir o acesso equitativo à vacina para todos os países, superar a hesitação da vacina onde houver fornecimento adequado e garantir melhores perspectivas econômicas para todos”, afirmou.
Gita citou ainda esforços multilaterais para garantir liquidez internacional adequada a economias restritas e a implementação mais rápida de uma estrutura do G20 para reestruturar dívidas insustentáveis, o que poderia ajudar a limitar as disparidades entre os países. “Com base na alocação histórica de US$ 650 bilhões de Direitos Especiais de Saques [SDR, na sigla em inglês], o FMI está convocando os países com fortes posições externas a canalizar voluntariamente seus SDRs ao Fundo para Redução da Pobreza e Crescimento.”
Em nível nacional, disse Gita, as políticas devem ser calibradas de acordo com as condições pandêmicas e econômicas locais, visando o máximo de empregos sustentáveis e, ao mesmo tempo, protegendo a credibilidade das políticas. Com o espaço fiscal se tornando mais limitado em muitas economias, gastos com saúde devem continuar a ser priorizados, afirmou, enquanto transferências de renda terão de se tornar cada vez mais direcionadas.
À medida que os resultados na saúde melhoram, disse ela, a ênfase das políticas deve se concentrar cada vez mais nas metas estruturais de longo prazo. “Com as dívidas públicas em níveis recordes, todas as iniciativas devem ser enraizadas em estruturas de médio prazo confiáveis, apoiadas por receitas viáveis e medidas de gastos. O Monitor Fiscal de outubro de 2021 demonstra que essa credibilidade pode reduzir os custos de financiamento para os países e aumentar o espaço fiscal no curto prazo”, afirmou.
Outro desafio para a economia global são as interrupções nas cadeias de suprimento. “Por um lado, surtos de pandemia e perturbações climáticas resultaram na escassez de insumos essenciais e na redução da atividade manufatureira em vários países. Por outro lado, essa escassez de oferta, junto com a liberação da demanda reprimida e a recuperação dos preços das commodities, fizeram com que a inflação ao consumidor aumentasse rapidamente, por exemplo, nos Estados Unidos, Alemanha e em muitos mercados emergentes e economias em desenvolvimento”, disse Gita, observando ainda que os preços dos alimentos sobem mais nos países de baixa renda, onde a insegurança alimentar já é mais aguda, aumentando o comprometimento das famílias mais pobres e o “risco de agitação social”.
Desacelerar o aumento das temperaturas globais e conter os crescentes efeitos adversos das mudanças climáticas devem ser outras prioridades globais, segundo Gita. “Isso exigirá compromissos mais ambiciosos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa na próxima Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26)”, afirmou. De acordo com Gita, o FMI estuda o estabelecimento de um Fundo de Resiliência e Sustentabilidade, “que forneceria financiamento de longo prazo para apoiar o investimento dos países no crescimento sustentável”, explicou.
De maneira mais geral, Gita disse que “clareza e ações consistentes” podem ajudar a evitar “acidentes de política desnecessários” que perturbam os mercados financeiros e atrasam a recuperação global, como reestruturações desordenadas de dívidas no setor imobiliário da China e crescentes tensões de comércio e tecnologia transfronteiriças.
Especificamente sobre a China, cujas projeções de crescimento foram reduzidas em 0,1 p.p. entre o relatório de julho e agora, para 8% em 2021 e 5,6% em 2022, Gita disse que “o rebaixamento muito pequeno” reflete um aperto fiscal maior do que o antecipado pelo FMI. “Há outros desafios, claro, que a China enfrenta neste momento, em termos do setor imobiliário, em disrupções na cadeia de produção”, acrescentou.
Foto: Getty Images
Por Suzi Katzumata e Anaïs Fernandes, Valor
Conteúdo originalmente publicado pelo Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor Econômico
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